Por Olivia Meireles para Metrópoles
Minha avó me ligava todo dia, batíamos papo sobre a vida e, de repente, ela não estava ali
Apesar de seus 87 anos, a morte da minha avó foi uma surpresa. Ela ainda tinha pleno controle da vida: morava sozinha, pagava as contas de casa e sabia tudo o que acontecia com as netas, os vizinhos, a família que mora longe. Segundos antes do último suspiro, sentada na poltrona do quarto, delegava questões domésticas para a minha mãe, minha tia e para a empregada. Ela não resistiu a um infarto.
Minha avó não acreditava em tabus. Não era psicóloga, mas dizia que o diálogo era a melhor maneira para evoluir e curar problemas. Abria feridas doloridas de amigos e familiares (fossem eles íntimos ou não), porque era convicta de que todo mundo devia encarar os problemas de frente. Dentre esses assuntos difíceis, que adorava revisitar, estava a morte.
Por conta de tantas conversas que tivemos sobre isso, quando ela se foi, tínhamos mais ou menos uma noção de como gostaria de ser lembrada. Todo 11 de julho, por exemplo, ela comemorava o aniversário do meu avô, falecido em 1994. Essas festas eram motivo de piada na família. Ela não ligava e, ano após ano, recebíamos o convite inusitado. Por mais bobos que nos sentimos, filhas, netas e genros nos juntamos, no primeiro ano sem minha avó, e cantamos parabéns. Celebramos a sua linda vida, da maneira que ela gostava.
Nesses sete meses, desde a sua partida, vejo cada pessoa da família lidando com o luto da sua própria maneira. Há quem busque respostas na religião, outras que vão a médicos perguntar por que ela se foi tão repentinamente e como poderiam ter ajudado mais. Eu gosto de acreditar que minha avó era dona de si e, na hora que cansou, tomou a decisão de ir embora.
Apesar das diferenças, todos nós temos um ponto em comum: como a morte sempre foi um assunto que permeou os bate-papos com ela, conversamos constantemente sobre sua partida. Ela nos criou para nos sentirmos à vontade com o assunto. Às vezes, buscamos respostas ou só queremos tentar preencher o vazio que ficou nas reuniões de família.
Neste processo de resgatar memórias, acabei descobrindo várias anedotas e facetas de sua personalidade que eu nunca tinha ouvido. Guardei cada detalhe das histórias relatadas pelas primas que cresceram com ela, pelo cunhado que parecia mais um irmão, pelo grupo de costura que se encontrava semanalmente, pelo porteiro do prédio onde morava, pela manicure que lhe deixava bela toda semana, pela cuidadora que lhe fazia companhia.
Toda vez que conheço um aspecto novo sobre minha avó, me dá a sensação de que eu consigo mantê-la viva por mais um pouquinho.
Falar sobre ela me fez bem. E ainda faz. Gosto de registrar o quão maravilhosa ela foi. Mas, às vezes, percebo como algumas pessoas ainda ficam desconfortáveis ao me ver relembrá-la com tanta naturalidade. Acredito que, na maioria das vezes, por não saberem como me confortar ou qual a frase correta para falar.
Mais uma vez, minha vozinha estava certa: precisamos lidar e escancarar os nossos medos.
Enquanto a sociedade ainda não é tão sábia como minha matriarca, acho importante divulgar iniciativas como a da chefe operacional do Facebook, Sheryl Sandberg. Nesta semana, ela lançou o livro “Option B: Facing Adversity, Building Resilience, and Finding Joy” (Opção B: Enfrentando Adversidade, Construindo Resiliência e Encontrando Alegria, em tradução livre).
Na publicação, ela conta como a morte do marido, Dave Goldberg, em maio de 2015, mudou sua vida. Eles estavam em um resort comemorando o aniversário de um amigo quando Dave foi encontrado morto por causas naturais na academia do hotel. No livro, Sheryl, uma executiva mundialmente famosa, mostra-se vulnerável e divide com o leitor seu processo de luto.
Ela também oferece algumas dicas valiosas para lidar com pessoas que vivem a perda de alguém querido:
Não evite as pessoas de coração partido (exceto quando elas pedirem por isso)
“Depois da morte de Dave, a simples ação de levar os meus filhos para a escola ficou diferente. As pessoas evitavam falar comigo por não saberem o que dizer, e veio o isolamento. As pessoas olhavam para mim como se eu fosse um fantasma”, lembra.
Não diga que tudo vai ficar bem
“Como você poderia saber?”, ela questiona.
Não pergunte como a pessoa está
“Formular uma resposta para essa questão pode ser muito complexo. Em lugar disso, pergunte como a pessoa está naquele dia específico”, aconselha.
Não pergunte: “Do que você precisa?”
“Reconheço a boa intenção dessa pergunta, e eu mesma costumava fazê-la a pessoas de luto. Em lugar de dar à pessoa o fardo de te dizer o que você deve fazer, que tal você tomar uma atitude? Um amigo perdeu o filho e outro colega apenas ligou e disse: ‘Estou no térreo do hospital pela próxima hora, se você quiser um abraço estarei aqui, basta você descer’”.
Construa a autoconfiança de quem está de luto
“No trabalho, dê a opção da pessoa se afastar. Caso ela não queira, reforce positivamente o trabalho que ela está fazendo. Meu chefe, Mark Zuckerberg (o CEO do Facebook), sempre me dizia: ‘Você está fazendo um belo trabalho, mesmo quando não era nada demais, e isso fez muita diferença’”.
O Metrópoles decidiu entrar na discussão e, por isso, também vamos falar sobre morte. A sub-editora de Vida & Estilo, Leilane Menezes, durante seis meses, frequentou aulas de cuidados paliativos de hospitais, onde profissionais dão qualidade de vida a doentes e familiares diante de enfermidades sem chance de cura.
Entrevistou 17 pessoas, entre médicos, pacientes, terapeutas ocupacionais e psicólogos para dar voz a seus anseios e aprendizados diante do fim. Nesse processo ela pinçou histórias emocionantes que nos ajudam a encarar com mais leveza a morte. Leilane tem o dom da palavra, por isso, pegue um lencinho e relembre com carinho aqueles que já se foram. Não devemos enterrá-los nunca.
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