Falar sobre o fim da vida é tabu para mais de 73% dos brasileiros
Por Vida e Ação
Reconhecendo a finitude: especialista traz dicas para que familiares e cuidadores saibam como proceder quando o fim se aproxima
Apesar de ser um aspecto intrínseco à vida, a morte é ainda um dos principais tabus nas sociedades modernas. O tema, considerado bastante delicado, chega a ser evitado nas rodas de conversas da maioria dos brasileiros. Um raro e inédito estudo sobre o tema constatou o quão pouco o Brasil fala sobre isso.
Realizada em 2018, uma pesquisa encomendada pelo Sindicato dos Cemitérios e Crematórios Particulares do Brasil (Sincep) e desenvolvida pelo Studio Ideias constatou que falar sobre o fim da vida é tabu para mais de 73% dos brasileiros. O levantamento constatou que apenas 21% dos jovens abordam o assunto, número que sobe para 32,5% entre adultos acima dos 55 anos.
Um dos motivos que fazem as pessoas evitar a temática é o medo, já que pelo menos 10% da população acredita que falar sobre atrai a morte. A sensação de falta de segurança também é outro aspecto que diminui os debates, já que pelo menos 30,4% das pessoas não sabem ao menos como ou com quem conversar.
A mesma pesquisa revela que o fim da vida é um dos fatos mais sofridos da existência. Para 82,4% dos brasileiros, não há nada mais sofrido que a dor da perda de alguém, enquanto 48,6% consideram que não estão prontos para lidar com a partida de uma pessoa querida.
“A questão da morte tem um aspecto cultural muito forte, e boa parte dos países do Ocidente trata o assunto com pesar. Esse é o caso do Brasil, que difere muito de países como o México, onde o Dia dos Mortos é comemorado com comidas, bebidas e até dança. Por lá, há um entendimento circular sobre a vida em que a morte é apenas uma passagem e não há motivo para ficar triste, já que todos se reencontrarão em breve”, explica Camila Souza, coordenadora do Instituto de Ensino Senior Concierge.
A morte é um aspecto intrínseco à vida, pois faz parte do ciclo natural da existência. Ainda o tema é um dos principais tabus, porém o fato de invisibilizar esse processo é extremamente prejudicial, o que faz com que a maior parte da sociedade não saiba lidar com essa questão.
Um estudo inédito foi realizado no Brasil chamado “Cartografia da Morte”, nele, um dado bastante peculiar é apresentado, o tema da morte é um tabu para mais de 73% dos brasileiros. Encomendado pelo Sindicato dos Cemitérios e Crematórios Particulares do Brasil (Sincep), foi constatado que os brasileiros têm uma dificuldade muito grande para falar e debater sobre assuntos relacionados com a finitude da vida.
Distintos da cultura japonesa, que realizam um grande festival chamado Obon, geralmente acontecem entre os dias 13 e 15 de julho, todavia a data não se festeja alegremente a morte, mas sim, o Obon é entendido como um momento de luto, silêncio, reflexão e paz em momentos difíceis. Para os japoneses, refletir sobre a finitude é principalmente um momento de pensar a vida e como ela tem sido utilizada.
A especialista em qualidade de vida na terceira idade e fundadora e CEO da Senior Concierge, empresa que pratica um modelo de atenção integrada para dar suporte a pessoas com mais de 60 anos, Márcia Sena, diz, que muitas vezes, quando pensamos na morte, centramos muita energia no medo do que ainda não veio e isso pode tornar esse medo pode causar pavor, angústia e até mesmo causar dor física. Por essa razão é preciso compreender que a certeza do fim pode contribuir na superação desse “choque”, na reflexão que muito do que viveu pôde trazer boas lembranças.
Márcia Sena, alega que conversar sobre a morte é essencial não apenas para quebrar mitos e normalizar o fato, mas também para garantir melhores formas de lidar com a finitude. Pois, reconhecer e debater sobre a questão de que a vida fatalmente se encerrará em algum momento ajuda nos preparativos que tornam menos penoso o momento para familiares e amigos principalmente de idosos.
“Muitas famílias que não conversam sobre o assunto acabam se deparando com várias dificuldades quando o inevitável chega. Isso traz um sofrimento ainda maior, já que as pessoas ficam sem saber quais eram as vontades de quem faleceu, por exemplo. Agir de forma preventiva garante que esse rito de passagem seja o menos aflitivo possível”, esclarece.
“Em uma doença terminal o conhecimento de como agir pode aliviar bastante o sofrimento de quem está partindo e de quem ficou. Há um desconhecimento muito grande sobre o fato de que é possível prezar pela qualidade de vida mesmo de quem está partindo. Desde 2018, o Sistema Único de Saúde (SUS) integra os cuidados paliativos como parte dos cuidados continuados para pacientes terminais. A ideia é garantir que essas pessoas recebam um conforto até o final de suas vidas”, lembra.
Como lidar nos momentos finais de um ente querido?
Sena afirma que o conhecimento de familiares e pessoas próximas sobre como proceder nos momentos finais da vida é fundamental também para garantir que todas as demandas de um idoso sejam atendidas.
Sendo assim, Márcia Sena elenca ainda 6 orientações que podem ajudar nesse momento difícil e delicado para os familiares e amigos próximos que conhecem alguém que está chegando ao fim da vida:
Reconhecer o fim: esse é um importante passo para tudo que se seguirá adiante. Entender sobre a finitude de nossas próprias vidas é lembrar que estamos todos em um grande processo cíclico de idas e vindas.
Não ter medo: saber que perdemos as pessoas mais importantes da nossa vida pode ser uma forma de se preparar para garantir que o momento da partida seja o menos doloroso possível. Não devemos ter medo de perder alguém porque esse é um fato inevitável para 100% dos seres humanos.
Não se culpar: é muito comum que pessoas próximas sintam culpa pela morte de algum ente querido, imaginando que poderiam ter feito mais ou até evitado aquele falecimento. O sentimento, que afeta até mesmo cuidadores profissionais, deve ser medido e controlado para que não gere prejuízos emocionais e sociais severos.
Garantir cuidados paliativos: em situações terminais é essencial saber os cuidados necessários. Em casos que há doenças com dores, é preciso apoio médico para que haja a receita dos medicamentos analgésicos mais adequados, por exemplo.
Entender que o tempo do luto varia de pessoa para pessoa: a morte de alguém próximo afeta de maneira bastante particular cada um que conviveu com aquele que se foi. Por isso, é necessário compreender que há pessoas que vivem o luto por anos, enquanto outras conseguem passar por essa fase difícil em meses. Esse entendimento é essencial para evitar julgamentos sobre o próprio estado e do estado dos outros.
Procurar ajuda de profissionais: o sofrimento psicológico às vezes é tão forte que pode ser comparável a dores físicas. Portanto, garantir apoio profissional psicológico ou psiquiátrico pode tornar menos difícil o processo de entendimento sobre o fim da vida.
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