Luto incompleto: o drama de quem está em busca por um familiar desaparecido
Por Raphael Santana para A Tarde
A adolescente Maria Eduarda Costa dos Santos, de 13 anos, avisou a mãe, Mércia dos Santos, que iria ao mercado, no último domingo, 18, no bairro do Jardim Cruzeiro, em Salvador, e não voltou mais. Foram dias de angústia e desespero. A mãe chegou a fazer todo o percurso da filha até o mercado, conversou com vizinhos, mas ninguém sabia o paradeiro da menina, que tem problemas mentais. Cinco dias depois, Maria Eduarda foi localizada no bairro de Saramandaia por uma mulher, que a ajudou a encontrar o caminho de volta para casa.
“Ela disse que levaram ela no carro, no domingo, e largaram nesta quinta-feira na Saramandaia. Ela ficou perdida, mas uma moça ajudou. Ela já apareceu. Eu estou muito feliz, muito feliz mesmo. Deus é muito bom. Agora é esquecer o que passou e cuidar mais dela”, contou emocionada a mãe da adolescente.
Nem todos têm a mesma sorte de Mércia. Há muitas famílias que buscam por um rastro, um vestígio ou uma notícia do ente querido desparecido, há meses e até anos, na esperança do tão sonhado reencontro.
Os pais de Vítor Santos Silva, de 20 anos, estão em busca do filho, que desapareceu no último dia 21 de setembro. De acordo com a família, ele morava sozinho, há pouco tempo, no bairro de Periperi, no Subúrbio Ferroviário de Salvador, estava desempregado e fazia ‘bicos’. Segundo familiares, delegacias e hospitais já foram procurados, mas, até agora, nenhum sinal do jovem.
Estatística
Uma média de 217 registros de pessoas desaparecidas foi feita diariamente no Brasil no ano de 2019. Em todo o ano passado, o número de registros chegou a 79.275. Os dados fazem parte do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, baseado em informações das secretarias estaduais de Segurança Pública, compiladas pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e divulgado na última segunda-feira, 19.
Do total, o estado de São Paulo é o que lidera a estatística em número de registros, com 21.745, seguido por Rio Grande do Sul (8.782), Minas Gerais (8.477), Paraná (6.749) e Rio de Janeiro (4.619). A Bahia ocupa a 13ª posição, com 1.747. Procurada, a Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP-BA) não respondeu à solicitação do Portal A TARDE, até o fechamento desta reportagem, para repercutir os dados do FBSP.
De acordo com a responsável pelo programa de pessoas desaparecidas da Delegação Regional do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), Larissa Leite, os parentes que têm que lidar com a dor do desaparecimento de um ente vivem com o que se chama de “perda ambígua”.
“O desaparecimento é um processo inconcluso, que oscila a cada segundo entre a esperança e o desespero, a ausência e a expectativa do reencontro. O luto não se faz para essas famílias, que ficam aprisionadas e dedicam suas vidas a isso. O sofrimento é pior quando tem menos apoio e orientação clara nas buscas. É quando as pessoas se lançam nas buscas, com seus recursos, colocando em situação de risco e exposição”, avalia.
Ainda segundo Larissa Leite, esta ausência gera consequências econômicas, sobrecarregando a saúde física e adoecendo essas famílias. “Muitas famílias congelam suas vidas para se dedicar a buscar a pessoa desaparecida”, conta.
Alternativas
A CICV tem como objetivo mitigar os efeitos e proteger as populações em situações de conflito armado e violência urbana. Aqui no Brasil, o trabalho é feito sob a perspectiva da violência. “A gente percebe que o desaparecimento é consequência destes dois contextos (conflito armado e violência urbana). O que observamos é a ausência de um sistema que forneça informações”, pontua.
Entre as possíveis saídas para garantir a identificação e descobrir o paradeiro das pessoas desaparecidas estão “a colaboração e coordenação interinstitucional, além da criação de centros de referências de pessoas desaparecidas”, completa Larissa Leite.
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