Trilogia do Medo
Por Rev. Abival Pires em seu Blog
ENFRENTANDO NOSSOS MEDOS
I JOÃO 4.7-21 MC 6.50
O medo certamente não é uma coisa nova, mas sim algo que preocupa a humanidade, desde sempre. Nosso tempo, nossa sociedade parecem estar marcados de modo especial por este sentimento vital, a tal ponto que os cientistas sociais já começam a falar de uma geração do medo. Os estudiosos concordam que o medo não é apenas um mal. O medo é necessário ao ser humano, na medida em que é uma espécie de sistema de alarme que nos adverte de ameaças. “O medo é expressão da limitação e transitoriedade, mas, também, expressão da esperança e do desejo”. O medo tem, pois, a função positiva de lembrar-nos sempre de nossos limites e de nossa condição humana. Mas existem também medos que perturbam a vida. O medo nos paralisa. Ele nos ameaça. Não sabendo como reagir, tais medos podem ser destrutivos. Eles nos prendem como numa jaula, da qual não conseguimos sair. O medo impede uma vida de abundância, conforme Jesus pregava. Pode ser que alguém viva tranquilo, em paz, sem problemas graves e com muitas coisas boas nas mãos, mas o medo não lhe permite desfrutar o que tem. O medo é paralisante, contagioso e desgastante. Por tudo isso, fica claro que o medo é um adversário que precisamos levar a sério. O medo é a causa secreta da maioria de nossos dramas. É a mola que nos impulsiona em direção ao desastre. Se quisermos ser felizes e construir uma história de vida bonita em realizações, teremos de enfrentar e derrotar esse poderoso inimigo. Em 1933, Franklin Delano Roosevelt tornou-se presidente dos Estados Unidos. No discurso de posse, desafiando a nação a empreender conquistas ousadas, ele pronunciou uma frase que ficou famosa: “A única coisa que devemos temer é o próprio medo”. Mas, em meio ao nosso medo, podemos sempre ouvir a palavra consoladora, animadora e libertadora de Jesus: “Não tenham medo”. Um exegeta contou quantas vezes ocorreria na bíblia a expressão “Não tenha medo”. São 365 vezes. Para mim é um número maravilhoso e uma feliz coincidência: é o exato número de dias de um ano. A cada dia do ano corresponde a promessa de Deus de nos livrar do medo e um convite para que façamos disso um estilo de vida. Nesse contexto quero examinar, à luz da palavra de Deus, três tipos de medo:
Medo do fracasso
Medo do futuro
Medo da morte
MEDO DO FRACASSO
Fracasso é uma palavra que tememos. Não queremos que ela faça parte do nosso vocabulário. Fracasso é sempre aquilo que acontece com os outros. Pelo menos cremos assim. Mas não é verdade. Todos fracassamos. Todos falhamos. Todos erramos. O fracasso faz parte da vida de qualquer ser humano. A palavra fracasso significa mau êxito, malogro, ruína; as palavras falível e falência têm a mesma origem. O sentido é de não alcançar o fim desejado. Todos fracassamos de muitas maneiras. Stephen Pile publicou um livro chamado: “O livro incompleto dos fracassos”. E lá está o relato da professora de Thomas A. Edison, dizendo que era um aluno burro demais para aprender; o professor de Albert Einstein que o chamava de mentalmente lerdo, insociável, sempre distante em seus sonhos tolos; um caça talentos de Hollywood falando de Fred Astaire: era calvo, não sabia cantar e dançava muito mal; e o editor de jornal que despediu Walt Disney porque alegava falta de imaginação. O que há de comum em todos estes fracassados? Eles fizeram do fracasso um ingrediente do sucesso. Mas para tanto é preciso estar disposto a fracassar. Thomas Edison é o melhor exemplo disso. Ele administrava uma média de 5.000 experiências. Diz-se que cada vez que uma dessas experiências falhava, ele sorria e ficava feliz porque tinha encontrado uma outra maneira em que sua invenção não tinha funcionado. Ele sabia que tinha chegado um pouco mais perto de descobrir o caminho certo da nova invenção. Vivemos numa sociedade que nos faz acreditar que só o sucesso conta e que o fracasso é vergonhoso. O fracasso nos humilha. Essa obsessão com o sucesso e o medo do fracasso, tão típica de nosso tempo, é diferente da visão de Thomas Edison, para quem o sucesso e fracasso são partes gêmeas do mesmo processo de descoberta e criatividade. Precisamos ser um sucesso em tudo e fracassar em qualquer coisa. O medo do fracasso nos leva a fracassar porque nos transforma em pessoas fracas, vacilantes, sem iniciativa. O medo do fracasso nos torna inseguros, nos faz duvidar de tudo e faz com que as coisas nunca cheguem a bom termo. Mas os fracassos não deveriam ser algo tão terrível. Uma pessoa sábia é capaz de aprender com os fracassos. Cada erro a ajuda a melhorar, a aprender algo novo e a crescer. Isso acontece principalmente quando confiamos de fato no Senhor, quando caminhamos com Ele, quando confiamos a Ele nossas tarefas e projetos, nossos sucessos e nossos fracassos. Qual o ingrediente mágico que pode garantir o sucesso e eliminar o fracasso de nossas vidas? É a fé. Nossa fé nos dá a segurança de que Deus nos levantará e não nos deixará prostrados em nosso fracasso.
MEDO DO FUTURO
Um medo muito difundido hoje em dia é o medo do futuro. O futuro apresenta-se para nós como uma nuvem escura e tememos que o dia de amanhã nos encontre sozinhos, abandonados, doentes. Que aconteça uma tragédia ou que nos sobrevenha uma catástrofe. O futuro é o desconhecido. O futuro é o incerto. É o medo de não ganhar mais o sustento. É o medo do futuro trazer consigo infortúnios, de ficar desempregado, de passar necessidades, de ficar só e abandonado. É exatamente em tempos de instabilidade financeira, de crise econômica, que as preocupações atingem. O mundo se transforma numa grande catástrofe, numa tragédia universal em pouco tempo. Acabamos com aquilo que levamos gerações para construir, com muito custo e sacrifício. Vivemos um momento assim, olhamos preocupados para o futuro e perguntamos o que ele nos trará. Esperamos pouca coisa boa e imaginamos sempre o pior. O medo do futuro faz parte intrínseca do ser humano, mas é também ele, o futuro, que nos mantém abertos e esperançosos para trabalhar por dias melhores. A sabedoria de vida nos convida a parar de pintar um futuro com tudo que possa acontecer e a voltar-nos para o aqui e agora da existência. Sermos gratos por aquilo que existe e temos e somos agora. Agora estou nas mãos de Deus, e Ele, por meio da sua palavra, nos diz para tomar ânimo e levantar a cabeça. Devemos deixar de ser resignados, desiludidos, cabisbaixos, olhando sempre o chão. Quando levantamos a cabeça, some de nós o temor que nos puxa para baixo e nos afunda e, quando olhamos para Deus, alarga-se a estreiteza de nosso horizonte. Não sabemos o que pode acontecer amanhã, é impossível ter o futuro sob nosso controle e não podemos pretender um Céu na Terra. Aqui tudo é passageiro, mas hoje, agora, neste momento, estamos aqui de pé, aprumados, de rosto levantado cheios de confiança em Deus, que nos sustenta, que tudo vê e que tudo sabe.
O MEDO DA MORTE
Nos Upanishads há uma história antiga de um grande rei chamado Yayati, que completou cem anos. Já era o suficiente. Já vivera demais. Tinha aproveitado tudo que a vida lhe dera. Fora um dos maiores reis do seu tempo. A Morte chegou e disse para Yayati: “Prepare-se. Chegou a sua hora. Eu vim buscá-lo”. Diante da Morte, Yayati, que fora um grande guerreiro e venceu muitas batalhas, começou a tremer e disse: “Mas é cedo demais”. A Morte então disse: “Cedo demais? Você viveu cem anos. Até seus filhos estão velhos. O seu primogênito tem oitenta anos. O que mais você quer?” A história é bonita e comprida, mas a interrompo neste ponto para chamar nossa atenção para o comportamento de Yayati, que não queria partir. Completara cem anos, vivera toda uma existência, mas não quer partir. Vai propor uma porção de barganhas com a Morte, para que não o leve. Essa, no fundo, é a história de todos nós, a biografia do ser humano. Por mais que tenhamos vivido não queremos morrer e por mais esperada que seja, sempre nos vai surpreender. Jacques Bossuet, o prelado e historiador francês do século XVII, ficou famoso por suas orações fúnebres. Em uma delas, enunciou uma constatação do óbvio: “Nos funerais só se ouvem palavras de surpresa por aquele mortal estar morto.” Aquele mortal estar morto!!! Qual a fonte, qual a razão da surpresa? Porventura não é a morte inexorável e sua chegada apenas uma questão de tempo e circunstância? Mas no fundo, somos todos como o rei Yayati: Não queremos partir. Um pastor foi visitar sua ovelha no hospital, era um senhor já idoso. Depois de uma conversa em tom pastoral, como só acontece nessas ocasiões, o pastor encerrou sua visita com uma oração. Cada petição do pastor era acompanhada por um enfático “amém” do enfermo. “Senhor, abençoa o teu servo” e o enfermo: “Amém, amém”. “Senhor, fortalece o teu servo. Amém,amém”. “Senhor, cura teu servo. Amém, amém”. “Mas, Senhor, se for da tua vontade levar o enfermo…” e o enfermo: “Ahn! Ahn”…
Gosto de ler biografias. Elas são lições de vida. Em sua biografia, o Papa João XXIII conta que quando de sua visita a um bairro operário de Roma foi convidado a visitar uma senhora idosa, que estava às portas da morte. Ele queria confortá-la. À medida que dizia que este mundo que ela agora ia deixar era, no entanto, um vale de lágrimas, a senhora moribunda levanta-se na cama e observa ao papa: “Mas Santo Padre, é que se chora tão belamente neste vale de lágrimas”. Um homem de meia idade estava com estafa. Os exames revelaram que os pulmões tinham sido seriamente afetados. O médico disse que ele precisava de um longo período de repouso e descanso. O paciente reagiu dizendo que não tinha condições de deixar o trabalho. “Bem”… disse o médico: “Você tem duas opções, você escolhe: a Suíça ou o Céu.” O paciente andou pela sala por algum tempo, pensativo, depois voltando-se para o médico: “Você venceu, fico na Suíça.” A morte é o maior mistério da vida. A vida tem muitos mistérios, mas não existe nada que se compare à morte. A morte é o clímax da vida. Um dia será preciso enfrentá-la. Ninguém sabe ao certo quando será o último dia. Pode ser hoje, pode ser amanhã, pode ser a qualquer momento. Essa é a porta pela qual todos nós sairemos da vida.
A segunda coisa importante a ser compreendida sobre a morte é que a morte é a única certeza da vida. Tudo mais é incerto, pode acontecer e pode não acontecer. A morte não. A morte é certa. Na expressão de Heidegger, considerado, por muitos, o maior pensador do século XX: “O homem é um ser diante da morte”. Essa é uma prerrogativa do ser humano. Os animais morrem, mas não sabem que morrem ou que vão morrer. As árvores morrem, mas não sabem que vão morrer. Qualquer tipo de vida desemboca na morte — a vida do rico e a vida do pobre, a vida de sucesso e a vida de fracasso, a vida do sábio e a vida do ignorante, a vida do pecador e a vida do santo. A morte não faz acepção de vidas.
A morte é um fim, mas a morte é também um novo começo. Porque nada acaba totalmente. Tudo continua, só a forma muda. O corpo não existirá mais, mas há algo dentro do corpo que não faz parte do corpo. A parte terrena voltará à Terra. O que é pó ao pó voltará. Mas há em nós algo do Céu que carregamos para sempre e traz a marca da eternidade. O apóstolo Paulo tinha uma idéia própria do que o esperava após a morte. Na Epístola aos Filipenses, ele escreve a respeito: … “porque para mim o viver é Cristo e o morrer é lucro.” . Em 2° Coríntios 5.8, ele escreve sobre o anseio de estar com o Senhor. “Estamos, repito, cheios de confiança, preferindo ausentar-nos deste corpo para ir habitar junto do Senhor”. Estar com o Senhor significa para Paulo estar em casa. Este é o mais profundo anseio de Paulo: estar para sempre com Cristo, com Ele, estar em casa. Nele, ter sua pátria. Santo Agostinho expressou essa tensão em belas palavras: “Aí descansaremos e veremos, veremos e amaremos, amaremos e louvaremos, louvaremos um feliz Aleluia no céu, onde os anjos são o templo do Senhor. E no louvor do Aleluia, nos juntaremos ao coro dos anjos: “Aqui embaixo, cantamos o Aleluia, ainda apreensivos, para que possamos cantá-lo lá em cima, tranquilos”. Como será feliz lá o Aleluia. Quanta esperança. Nada de adverso, onde ninguém será inimigo, onde não morre nenhum amigo. Lá, louvores a Deus. Aqui, louvores a Deus, mas aqui apreensivos. Lá, tranquilos; aqui dos que hão de morrer, lá dos que para sempre hão de viver. Aqui, na esperança; lá, na bem-aventurança; aqui; no caminho; lá, na pátria.
O Amor Lança Fora o Medo
Qual o melhor remédio contra o medo? O amor é o melhor remédio. Uma história antiga conta como um jovem rei, ávido de sabedoria, incumbiu os sábios de seu país de escrever para ele, aquilo que fosse mais importante saber. Os sábios iniciaram logo o trabalho. Depois de 40 anos, apresentaram o resultado em uma obra de mil volumes. O rei que nesse meio tempo já havia completado 60 anos de idade, disse: “Eu não posso mais ler mil livros. Reduzam tudo ao essencial. Após dez anos, os sábios haviam reduzido tudo a 100 livros. O rei disse: Isso ainda é muito, eu já estou com 70 anos. Escrevam apenas o essencial. Os sábios se puseram uma vez mais a trabalhar e reduziram tudo que era mais importante, a um único livro. Eles o trouxeram ao rei, quando ele já estava no leito de morte, mas ele queria ainda saber pelo menos o essencial, a conclusão do trabalho dos sábios. Ela veio em uma única frase: “Eles viveram, eles sofreram, eles morreram e o que conta e sobrevive é o amor.” O ser humano não pode viver verdadeiramente sem o amor. Para Lutero, é no olhar para o amor que está a libertação do medo. Na figura do filósofo alemão Ulrich Hommes: “O amor é a verdadeira fortaleza contra o medo”. A única força capaz de derrotar o medo é o amor. O amor significa: Unir e não separar, construir e não destruir, dar e não possuir, perdoar e não vingar, entender e não condenar, perseverar e não desistir, confiar e não duvidar, acolher e não desprezar. Amar é difícil. Na expressão feliz da Madre Tereza de Calcutá: “O amor começa lá onde ele dói”. Ou na sabedoria do provérbio chinês: “As flores da cerejeira crescem com o orvalho das lágrimas”. Sim, amar é difícil, amar dói, amar machuca mas também só o amor nos enche de coragem e determinação, nos estimula a seguir em frente. Apesar de todas as frustrações não nos deixa desistir da vida. O amor nos mantém ativos, o amor gera saúde física, emocional e espiritual. O amor cura nossas enfermidades. O amor pacifica nossa consciência, enche-nos de entusiasmo. O amor nos rejuvenesce. Quando se ama o amor transparece no corpo e no rosto, ilumina a face e o coração. O amor nos alegra, permite ver a vida com entusiasmo e o mundo com generosidade. O amor busca o que há de bom na vida. O amor nos aproxima de Deus, pois, Deus é amor.
Medo do fracasso? Não tenham medo.
Medo do futuro? Não tenham medo.
Medo da morte? Não tenham medo.
Não tenham medo porque pelos caminhos da vida “eu mesmo os conduzirei com laços de bondade humana e de amor”. (Oséias 11.4)
PERMITA QUE O AMOR DE DEUS O ALCANCE
AMÉM!
Rev. Abival Pires da Silveira
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