Luto é eterno? Entenda o que é e como lidar com essa fase da perda
Por Melissa Marques Para Site Minha Vida
O sentimento pode se manifestar de diversas formas em casos de perdas importantes
O que é Luto?
O luto é um processo sentimental que ocorre quando o ser humano perde alguém importante. A angústia causada pela falta é dolorosa, mas é importante vivenciar esse estado emocional para conseguir seguir em frente.
Cada um tem uma experiência completamente individual com a perda. Mesmo que haja um grupo ou família passando pelo luto ao mesmo tempo, cada um expressará seus sentimentos de forma diferente, com mais ou menos intensidade.
É importante frisar que o luto não irá ocorrer apenas ao perder pessoas queridas. As mudanças também desencadeiam o mesmo sentimento, seja ao terminarmos relacionamentos, perder animais de estimação ou perder objetos significativos.
O luto também é particular e, por vezes, pode ser vivenciado em silêncio, com a continuidade da vida profissional e particular. Isto não significa que a pessoa não esteja carregando e elaborando o sofrimento desta perda, já que não há regras sobre como devemos reagir às adversidades da vida.
O importante é sair da fase de negação e passar para a aceitação do ocorrido. Quando fazemos isso, não há problemas em não acontecer a melancolia. Entretanto, é muito importante que você tenha a ajuda de um profissional para entender se a tristeza realmente não ocorreu neste processo, ou se você está no período de não aceitar a morte ou perda.
O luto é eterno?
O luto não é uma doença ou síndrome, nem mesmo sinônimo de vida desestruturada. Cada caso apresenta particularidades, mas de maneira geral, ele não permanece por toda nossa trajetória.
Causas
O luto não precisa estar diretamente ligado a um processo da morte de alguém, pode e até deve estar relacionado a outros diversos processos de perdas e mudanças intensas que vivenciamos na vida, desde objetos na infância, moradia, amigos, escola, trabalho, namoro, casamento, mudança de cidade ou país, desde que represente uma perda significativa.
Na história, a ideia de morte era vista de outra forma, era uma realidade, tanto pela expectativa de vida mais curta, doenças, poucos recursos médicos, guerras contínuas. Pode se dizer que a morte era vista como algo mais natural, talvez havendo mais espaço para ser vivida, nomeada, sentida e assim superada. As perdas, logo as mortes, eram elementos da vida real, uma dor como parte do viver.
Os rituais sempre existiram e são fundamentais na concretização da morte, local e momento para se expressar a dor e receber condolências, para se despedir e se preparar para um novo ciclo que vai iniciar na vida de quem fica.
Hoje em dia, é possível dizer que se fala muito de morte, mas não se elabora sobre ela. A pessoa assiste a tragédias, violências e epidemias, mas não considera ser atingida por ela. A morte é algo a ser evitada, como se o ser humano tivesse o poder de viver para sempre, ou como se pudesse criar um padrão, somente morre após certa idade, ou se possui certos hábitos, se for de adoecimento severo. Quando, na verdade a morte existe porque se está vivo. Esta negação social pode ser um dos motivos relevantes para o luto ser um fator causador de tantas angústias.
Tipos
Não há tipos de luto, ele apenas varia de intensidade. Normalmente, o luto está relacionado a um processo pós-morte de alguém conhecido e muito próximo. Mas pode acontecer em um período pré-morte, ou seja, durante um tratamento delicado ou adoecimento severo – onde tanto os familiares como o paciente vivenciam um luto ainda em vida, numa espécie de despedida.
Luto por um amigo
A perda de um amigo é tão delicada quanto a de um familiar, filho ou companheiro. Logo no início, não sentimos vontade de nos abrir para novas relações, pois há a sensação de que estaremos traindo a memória daqueles que amamos caso nos permitamos a criar novas conexões.
Para a psicóloga Milena Lhano, também é comum que as pessoas não se sintam prontas para viverem emoções como o afeto. Mas, com o tempo, todos nós podemos elaborar o luto e perceber que nunca iremos substituir ou trair quem partiu.
“As memórias da pessoa que partiu estarão sempre vivas dentro de você, e os novos vínculos apenas irão expandir a sua capacidade afetiva de estar conectado com mais pessoas queridas”, diz a especialista.
Sinais
Um processo de luto pode gerar algumas reações emocionais ou psicossomáticas como:
- Crises ansiosas
- Crise de estresse
- Crise de choro
- Reações de depressão
- Excesso ou falta de apetite
- Melancolia
- Crises de raiva
- Insônia
- Desânimo intenso para estudar, trabalhar, sair, cozinhar, se cuidar ou cuidar de algo ou alguém.
Estágios do luto
Há alguns estudos que apontam para os estágios do luto. Estes estudos partiram de uma pesquisa especifica com pacientes terminais e seus familiares, mas com o passar do tempo, foi sendo utilizada por outros casos de luto e morte, devido a fácil identificação do processo do luto no geral, com estas etapas. Sendo elas:
- Negação: quando a pessoa evitar falar, fingir não estar acontecendo e usar sua estrutura emocional para lutar contra a morte;
- Raiva: momento de ira, questionamentos, revolta, expressados de forma inquieta, chorosa, normalmente relacionado por não poder mais negar o fim;
- Barganha: uma negociação que se faz consigo mesmo, com o meio, até com Deus e outras entidades religiosas, onde entende que não pode mais negar a ideia de morte, mas ainda tenta desviar os sentimentos para outras ideias, camuflar, ou mesmo negociar uma última oportunidade, último momento, para depois se permitir a aceitar;
- Depressão: quando já não há mais força emocional, para lutar contra os medos e a dor da perda e o fim é assumido e encarado;
- Aceitação: quando a dor começa dar espaço para um processo de superação. Sofrer a dor da perda, não tomará mais todo o espaço da vida já poderá voltar a pensar em planejar, construir e seguir em frente, enquanto ainda lida com sua dor.
Não há um tempo certo para cada estágio, nem mesmo é necessário que se siga a ordem ou que ocorra todos, isso sempre será muito particular a cada caso.
Diagnóstico
O luto não é uma doença ou síndrome a ser tratada ou curada, é um processo de perda a ser vivenciado por aquela pessoa e é muito particular, assim como a complexidade de cada caso.
O primeiro e único ponto que irá dizer se está vivendo um processo de luto é a existência de uma perda significativa, normalmente ligada a morte de alguém próximo e importante na estrutura de vida.
Buscando ajuda médica
Os sintomas ou reações do luto não precisarão necessariamente de auxílio profissional. Tudo irá depender da intensidade, da frequência e do tempo que esse processo pode durar.
O quadro merece bastante atenção quando está interferindo na qualidade de vida da pessoa enlutada, ou seja, se ela está sendo prejudicada de forma significativa no trabalho, estudos, saúde ou o abandono de si ou do meio. Nestas situações, deve-se procurar um psicólogo para avaliação.
Tratamento
O luto não necessita de tratamento medicamentoso, pois não se trata de algo a ser curado, mas sim vivenciado e que não possui padrões, mas ao contrário irá levar em consideração a estrutura emocional, social, cultural e época de vida daquela pessoa. Estes são os pontos determinantes para explicar a intensidade ou não de um luto. Por isso o processo psicológico é a ajuda profissional mais indicada.
Mas nos casos em que houver reações emocionais com sintomas psíquicos (crises depressivas, de estresse, de raiva, insônia…) a consulta a um psiquiatra e o uso de medicamentos deve ser considerados.
Tem cura?
O luto não é algo a ser curado, mas sim vivenciado, acolhido e percebido por alguém de fora e também pelo enlutado. Com o tempo e também com olhar adequado para cada caso, as angústias vão sendo compreendidas e trabalhadas e assim encontrando lugar na vida daquela pessoa, que poderá voltar a construir, sonhar e desejar um futuro para si.
Quanto tempo dura o luto?
Não há prazo certo para acontecer o processo, pode durar meses ou anos. Os lutos de pessoas mais próximas como filhos, maridos, esposas, mães e pais, costumam ter maior intensidade e a sensação dolorida de angústia durar entre um a três anos, em média.
Os demais casos costumam levar menos tempo e ter seu pico de tristeza mais nos primeiros meses e durar até um ano. Mas não podemos padronizar um tempo ou um caso. O luto não funciona desta forma e portanto não pode ser entendido dentro de técnicas ou padrões rígidos e classificatórios.
Convivendo (Prognóstico)
Como lidar com o luto
Tudo vai depender de cada história, cada relação, cada impacto vivido com essa perda. Mas de uma forma geral pode-se dizer que para lidar com essa perda tão significativa é preciso respeito, respeito de si mesmo com sua dor, momento e sentimentos, assim como por parte dos outros.
O luto não pode ser evitado, é um processo que todos ou quase todos passamos em vida. Ele deve ser entendido como algo natural do ser humano e percebido, não negado ou disfarçado. Isto é, tanto a pessoa enlutada como aqueles que estiverem acolhendo esta pessoa não devem fingir, negar ou disfarçar o assunto.
Assumir a dor, a tristeza (muitas vezes profundas), se permitir a chorar, a se recolher é fundamental. Assim como entender que a vida deste ponto em diante irá mudar e será preciso se readequar. O choro é a maior forma de expressão dos sentimentos, e é muito comum. Não há porque segurar, chore se sentir vontade.
Fale sobre a pessoa querida, relembre momentos bons e engraçados com ela. Verbalizar dá espaço para esvaziar os sentimentos e entrar em contato com eles. O importante é não ter pressa, sua mente estará tentando se adaptar a esta ausência e tentando redirecionar a fonte se segurança e aconchego para outras refêrencias em sua vida e isso leva tempo.
Viver o luto: por que é importante?
De acordo com Milena, quando reprimimos o processo de luto, ele pode se tornar patológico. Isto significa que, ao invés de sofrermos por um período de até 12 meses, podemos enfrentar a angústia da perda por anos, desencadeando sentimentos profundos de tristeza e até depressão.
É possível se preparar para viver o luto?
A morte é uma situação complexa. Podemos pensar em diversas formas de suportar o momento, mas quando ele chega, nossas emoções podem nos dominar, e está tudo bem.
Segundo Milena, a única coisa que podemos fazer é entender que a perda é um processo natural da vida, e portanto, inevitável. “É importante desapegar-se aos poucos, e entender que em algum momento, todos vamos para caminhos diferentes”, explica.
Nutrir o sentimento de gratidão também pode ajudar. “Agradeça pelos momentos que teve com a pessoa e tudo o que aprendeu enquanto ela esteve ao seu lado”, recomenda a psicóloga.
Complicações possíveis
Os pontos mais críticos do luto não vivenciado, acolhido ou percebido se caracterizam pela desistência da própria vida, dos sonhos futuros, dos projetos, abandono da saúde e dos cuidados da pessoa com si mesmo. Normalmente, isso acontece por sentir culpa em seguir com sua vida adiante ou em ser feliz sem aquela pessoa.
A desistência dos sonhos traz consigo um desejo de morte para se livrar da culpa de seguir com a vida enquanto o outro não pode mais, ou também para representar a possibilidade de se encontrar com a pessoa falecida em outra dimensão (pós-morte).
Referências
Raquel Baldo Vidigal (CRP 06-79518), psicóloga clínica com base psicanalítica
Milena Lhano (CRP 102952), psicóloga clínica sistêmica, com vasta experiência no atendimento de questões familiares e amorosas
A publicação original está aqui.