Luto, perda e viver com a ausência

Por Helena Pinto para Site Terra Ruiva

 

Novembro inicia-se com a homenagem aos que já partiram. O Dia de Finados leva familiares e amigos a recordarem os seus ente queridos e, de alguma forma, cuidar das memórias deixadas.

Apesar da perda ser inevitável ao longo da vida humana, a morte de um ente querido confronta as pessoas com desafios especialmente complicados e momentos de angústia e dor. A forma como se vive o processo de luto pode levar a consequência de cariz psicológico, comportamentais, sociais, físicas e económicas.  O impacto no indivíduo e na estrutura familiar, pode transformar o que podia ser um processo de luto normal, num luto patológico.

 

O luto complicado é definido como “a intensificação do luto até ao ponto no qual a pessoa se sente sobrecarregada, recorre ao comportamento desadaptativo ou permanece interminavelmente num estado de luto sem progressão em direção ao seu termino” (Horowitz – 1980). Neste caso, podem ocorrer imagens intrusivas, reações emocionais excessivas, insónia, sentimento crónico de vazio, negação das implicações da perda para o próprio, evitamento de tarefas que façam lembrar o falecido, dificuldade na implementação de atividades adaptativas, com implicações na vida pessoal, social e  laboral.

É muito importante o apoio logo numa fase inicial. Aprender a lidar com a morte, aceitar a morte e integrar a ausência da pessoa no futuro, é um desafio que para muitas pessoas parece impossível de ultrapassar, mas fundamental para que o luto seja vivido de forma a não se tornar complicado ou patológico.

No caso das crianças, na sociedade atual, tenta-se evitar o tema da morte junto das mesmas. Contudo, mesmo achando que estamos a proteger, isto não vai contribuir para o seu conforto físico ou proteção. Como refere Kubler-Ross (1991), uma grande especialista do luto nas crianças, o fato de se permitir que a criança, de acordo com a fase de desenvolvimento em que se encontra, participe na conversa, faz com que “…não se sintam sozinhas na dor, dando-lhes uma responsabilidade e luto partilhado. É uma perceção gradual, um incentivo para que encarem a morte como parte da vida, uma experiência que pode ajudá-las a crescer e amadurecer.”

Ainda segundo esta especialista, as reações emocionais e comportamentos da criança perante a morte não são equivalentes às dos adultos. A perda é vivida de forma diferente consoante a idade, o desenvolvimento cognitivo e as vivências prévias relacionadas com a morte ou perda.

Na fase pré-escolar, a criança ainda não adquiriu a noção de irreversibilidade, de não funcionalidade e universalidade. Ou seja, que a pessoa não vai voltar a viver, que o seu corpo deixou de funcional e que todo o ser vivo tem inevitavelmente de morrer um dia. Nesta fase a criança associa a morte a uma grande tristeza, pois é isso que é transmitido pelo comportamento dos adultos, mas não pensam ser irreversível e fantasiam com a possibilidade de voltarem a estar com a pessoa falecida. Ideia muito transmitida pelos desenhos animados, em que se morre e logo se volta a estar bem. Também muitas vezes os adultos, tentando evitar a dor na criança, inventam histórias, como o “foi viajar”; “está a dormir”, … Ainda nesta fase a criança tem tendência a personificar a morte, como se fosse algo que terceiros têm o poder de fazer acontecer e que pode ser evitado com boas ações, pois é concebida como uma punição pelo mau comportamento. Entre os cinco e os nove anos, a criança vai construindo uma noção da morte como algo irreversível, começando a questionar os adultos sobre o destino da pessoa falecida. Só entre os nove e os doze anos, na transição para a adolescência, se interioriza a morte como um fenómeno universal, irreversível e comum a todos os seres vivos.

Independentemente da idade da criança, é importante integrá-la nos rituais da família. Inventar que o falecido viajou, foi trabalhar para longe, … pode provocar um sentimento de abandono, aliená-la da vivência familiar do luto e colocá-la numa vivência solitária do sofrimento. Esta situação pode levar a prejuízos maiores, como baixa autoestima, autoconfiança e perda de confiança nos adultos.

No Luto, é importante aceitar a morte e aprender a viver com a ausência, deixar ir o menos bom, saber guardar as memórias positivas construídas.

“Eu sou eu, vocês são vocês. O que eu era para vocês, eu continuarei sendo.

Você que aí ficou, siga em frente, a vida continua, linda e bela como sempre foi.” (Santo Agostinho)

 

Publicação original, você encontra no link abaixo

Luto, perda e viver com a ausência

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