Minha mãe

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Veio um câncer, uma operação, depois ele voltou. Radioterapia. Quimioterapia. Pensamos “vamos vencer isso juntos”, mas o câncer não ia embora. Voltava e voltava. O cabelo da minha mãe caiu, ela foi ficando magra e pequena. A mulher que me criou sozinha. A minha rocha. A pessoa mais forte do mundo. Foi ficando magrinha, pálida, pano na cabeça, deitada no sofá o dia inteiro com um rosto agoniado. Fui vendo minha mãe ir embora.
Nessa época chorei demais. Me senti sozinho. Outros amigos perderam os pais para o câncer, mas os pais dos meus amigos não eram minha mãe. Minhas mágoas, lembranças e afetos são peculiares. Perder um pai dói de uma maneira muito específica. Me senti entrando para um orfanato, um grande orfanato sem nenhuma outra pessoa dentro.
A quimioterapia não funcionava, a radioterapia causava dor, ouvimos falar de outro tratamento, um experimento, difícil de conseguir vaga. Ora, nos últimos dois anos, todos me diziam que estavam rezando pela minha mãe. Com tanta gente rezando vamos conseguir entrar nesse tratamento, mãe. Vamos lá, mãe. Levanta desse sofá, vamos pra outra cidade falar com esse médico, vamos fazer a biópsia, exames, consultas. Minha mãe estava exausta, queria desistir, mas eu e a minha irmã não deixamos. Você vai viver mais um pouco, mãe.
Achávamos que minha mãe não viveria o ano novo. Ela está aqui. O tratamento está dando certo, todos os cânceres estão diminuindo. O cabelo da minha mãe está crescendo de novo. Esses dias ela estava na praia, rindo com minhas filhas.
Sei que minha mãe vai morrer. Sei que vou entrar um dia para aquele pavoroso orfanato vazio. Mas a força da minha mãe vai continuar aqui, me acompanhando. Como ela sempre fez.
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