O Luto e o Natal

Por Herica Cristina Fernandes Blog Psicologia Viva

O Natal está chegando, as festas de final de ano estão aí e como passar por esse período quando o coração está ferido e a alma está sangrando?

Como entrar nas lojas e escutar aquelas musiquinhas e não se emocionar?

Como ver tantas pessoas repletas de sacolas e lembrar de que não tenho emprego?

Como olhar para uma lista de presentes e não encontrar o nome da pessoa que você ama?

Como chegar aos lugares todos enfeitados e lindos e não estar em clima algum em participar?

Muitas vezes a dor que foi suportada durante o ano todo acaba ficando insustentável nessa época de muitos significados, independente de crenças e o enlutado se cobra se deve ou não festejar esse período.

Depois que perdemos alguém, achar sentido nas datas comemorativas, pode ser algo demorado e dolorido. Parece que o natal é um amplificador de perdas.

Pode ser o seu primeiro natal e passagem de ano sem a pessoa que você ama ou pode ser mais uma data muito significativa sem ela. A sensação é de ausência, é de vazio é de solidão. A sensação é de não pertencimento, parece que estamos vivendo em uma época que não nos pertence mais. Uma parte de nós foi embora, uma pessoa primordial na minha existência, não está comigo mais e não será a mesma coisa mesmo! Após a perda de alguém uma transformação interna acontece e isso é inevitável.

E como passar por isso tudo?

Como passar esse período que é tão cheio de significado e não desmoronar por dentro?

Precisamos nos silenciar, ouvir e respeitar os nossos pensamentos e sentimentos e com isso resolvermos se queremos participar das festas e dos rituais. Você não precisa fazer parte de uma comemoração, se não deseja. Sabemos que existem outras pessoas à nossa volta, mas preciso me respeitar e fazer desse período algo mesmo doloroso, naquele momento. A sua vida mudou, não é a mesma sem a pessoa que era muito especial para você. Não dá para acionar uma tecla e simplesmente fingir que nada está acontecendo. Não dá mesmo! Teremos que nos readaptarmos.

Não conseguimos apagar da nossa mente e da nossa vida situações passadas com alguém que fazia parte da nossa existência, mas temos o dever de sermos sinceros com o momento que estamos passando! Não adianta não falar sobre o que aconteceu ou fingir que não está doendo. Doi e o que eu posso fazer para amenizar essa dor? Isso é possível? O primeiro passo sempre é se acolher.

Existem relatos se pessoas que dizem sentir vontade de dormir no Natal e acordar somente no Ano Novo! Mesmo não sendo possível é uma vontade é compreensível. Enquanto outras trabalham e muito nesses dias, como uma forma de extravasar os sentimentos. E tudo bem!

Como também existem pessoas que querem quer participar das comemorações e ficar próximo das pessoas e amigos que ama! E isso é algo muito saudável também! Respeite você! Respeite o seu coração. O luto é assim, tem momentos que estamos bem e queremos ficar próximos aos nossos familiares e outros nem tanto. O que preciso ressaltar aqui é que você deve fazer o que o seu coração mandar e sem culpa e julgamentos.

Nos momentos mais difíceis é reconfortante estarmos cercados de pessoas que saibam acolher a nossa dor, temos a sensação que quando estamos próximos a pessoas que passaram ou passam por situações parecidas, estamos dividindo o sofrimento.

Dê espaço para o seu sofrimento, ele é seu. Respeite o seu tempo. Se quiser ficar sozinha, fique. Se quiser ficar ao lado dos familiares que estão ali, fique! O primordial é você se respeitar, respeitar o seu coração e se acolher.

Uma dica muito importante, diz respeito aos os rituais. Faça algo que te conecte com a pessoa que partiu. Faça coisas que te deixe em paz. Tente acessar, dentro de você, essa pessoa e agradeça a ela a relação que vocês tinham e ainda tem. Não é algo fácil, mas é algo que conforta nosso coração. Ela partiu, mas estará com você o tempo todo. Uma pessoa que estava fora de você agora faz parte de você. Quando estamos no processo de luto, é muito comum não nos encaixarmos nesse momento de festa, queremos nos recolher. Cobranças externas podem acontecer, as outras pessoas querem a nossa presença e a nossa participação, nos falam que é importante estarmos juntos, mas se não for isso que você deseja fazer, não faça. Se não formos sinceros com a nossa dor e com a forma que desejamos vivenciá-la, não estaremos sendo verdadeiros com os nossos sentimentos.

Com o passar do tempo, que é de cada um, vamos percebendo que a celebração familiar é algo muito importante, mesmo a ausência e a dor estando ali presentes. Ao mesmo tempo em que sinto a dor da ausência sou grata por amar tanto e sou grata também às pessoas que ainda estão presentes na minha vida.

Uma perda nos ensina a valorizar a vida. Faz-nos pensar que precisamos celebrar a vida dos que amamos e que estão presentes. Depois que experimentamos a dor do luto, o medo de outras perdas ficará evidente e o que podemos fazer é estarmos presentes na vida dessas pessoas. Pode parecer estranho falar isso, mas com o passar de muito tempo, percebemos que aprendemos muito com as perdas, cada uma trás um novo significado e uma nova reflexão porque nos transformaremos em outras pessoas. Ficamos feridos e a única opção que temos é encarar essa dor de frente. Perceberemos que se continuarmos a manter o foco na perda, não conseguiremos participar e celebrar a vida das pessoas que estão à nossa volta.

Durante o luto nos sentimos órfãos e muitas vezes, parece que não tem saída. No luto começamos várias transformações. Algo que tinha muita importância passa a não ter e vice versa. Passamos por um momento de transformação interna. O vazio se instala e esse lugar não será ocupado. É como um lugar vazio na mesa. Faremos uma ressignificação e com isso conseguiremos prosseguir com o nosso caminhar.

Enfim, acredito que o primordial é permitir-se.  Faça aquilo que fizer sentido para você e te trouxer um significado.

“O que a memória ama fica eterno. Te amo com a memória, imperecível.”(Adélia Prado)

Para conferir a publicação original, clique aqui.

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