Terapia: quando é hora de pedir ajuda?

Por Sara Dias para Portal do Impacto

Sempre me pego pensando nos motivos que nos levam a trabalhar no terceiro setor. Sei que poderia estender essa pergunta para todas as profissões existentes e no porquê escolhemos nos relacionar com elas, porém, acredito que estar no setor de impacto social envolve algumas peculiaridades.

Vou citar, como exemplo, o altruísmo. Essa característica, que nos faz instintivamente nos preocuparmos com o outro, é muito latente em nós, ela nos faz sairmos de nossas rotinas particulares e nos envolver em causas que podem transformar nossa sociedade, que podem gerar grandes impactos. Podemos citar também a solidariedade, a empatia, a generosidade e o ímpeto de doar. Doação de tempo, de atenção, de recursos, etc.

Agora, dentre tantos aspectos positivos, podemos encontrar alguns que nem sempre trabalham a nosso favor. O autossacrifício é um deles. Ele nos faz colocar um foco excessivo em outras necessidades que não as nossas. Nos faz também ter uma autoimagem de força, quase inabalável, permitindo que não estejamos abertos para pausas, para divisão de tarefas ou pedido de ajuda.

O fato é que somos humanos, não super-heróis. Adoecemos, ficamos deprimidos, temos medos e ansiedades. Precisamos reconhecer nossos limites e escutá-los.

Por muito tempo, a ideia de recorrer a um profissional da área da saúde mental, quando as emoções não iam tão bem, como terapeutas, psicoterapeutas e psiquiatras, era um grande tabu. Havia um mito (e eu ouso dizer que ainda há) de que quem buscava terapia era louco, insano, e provavelmente, estava prestes a ser internado em um hospital psiquiátrico, mais conhecido como manicômio.

Aos poucos essas crenças vêm sendo transformadas e têm tornado a psicoterapia mais próxima e acessível. Isso tem possibilitado um acompanhamento que vai além do tratamento de transtornos graves, como a depressão e ansiedade, mas sim, na prevenção de um esgotamento de nossas forças.

A terapia é uma ferramenta que, por meio do autoconhecimento, pode nos ajudar a compreender nossos sentimentos e emoções. Pode também nos auxiliar a passar por momentos difíceis como luto, separações e conflitos nas relações, nos capacitando a lidar com essas questões da melhor forma possível.

Para Carl Jung, o principal objetivo da terapia psicológica “não é transportar o paciente para um impossível estado de felicidade, mas sim, a ajudá-lo a adquirir firmeza e paciência diante do sofrimento. A vida acontece num equilíbrio entre a alegria e a dor”.

Não há técnica ou receita que nos garanta a felicidade plena, nem mesmo o sentimento de satisfação perante a vida, porém, há caminhos que podem tornar nossa caminhada mais leve, e a terapia é uma delas.

Cito neste texto o psicoterapeuta e psiquiatra Jung, criador da abordagem Junguiana de terapia analítica, porém há inúmeros tipos de profissionais e metodologias que desenvolvem ferramentas como a autoconsciência, resolução de conflitos, descoberta vocacional, superação de traumas, etc. Dentre os profissionais que podem facilitar esses processos estão: psicólogos, psicanalistas, psiquiatras, terapeutas e coaches. Podemos escolher o que mais nos identificamos, não precisamos lidar com tudo sozinhos.

O trabalho interior é um processo contínuo, complexo e evolutivo, mas, uma vez iniciado, irradia por onde passamos e atuamos. Jung, assim afirma, dizendo que: “Conhecer a sua própria escuridão é o melhor método para lidar com as trevas das outras pessoas”. E se há um lugar onde lidamos com pessoas, é o terceiro setor.

O empenho individual é imprescindível para o desenvolvimento de um processo terapêutico, contudo, sigo defendendo que, apoio ou suporte psicológico, para trabalhadores do terceiro setor, também é uma questão a ser priorizada pela Gestão de Pessoas. Quando raramente vemos um terapeuta inserido no contexto das ONGs, normalmente ele está inserido em um programa de atendimento ao público atendido por ela e seus familiares. Mas e o cuidado com quem cuida, onde fica?

Esse tema já tem sido priorizado há algum tempo por iniciativas como o The Wellbeing Project – cocriação da Fundação ASHOKA em parceria com a Esalen, do Impact Hub, da Porticus, da Skoll Foundation e da Synergos – que desde 2014 trabalham para “catalisar uma cultura de bem-estar interior para todos os agentes de mudança”.

Em uma pesquisa desenvolvida pelo mesmo projeto, em 2017, com mais de 250 agentes de mudanças recrutados, eles relatam: “Aprendemos que era universalmente difícil para os respondentes se distanciar de seu trabalho por se identificarem intimamente com suas funções e por sentirem que trabalhar demais era ainda considerado um distintivo de honra dentro do setor. Também ficou claro que as organizações e o setor em geral desempenhavam um papel significativo ao possibilitar uma cultura que apoiava ou rejeitava seu bem-estar interior”.

Enquanto essa revolução gerencial, a favor do bem-estar no terceiro setor, não se faz a larga escala, seguimos com nossa autoanálise, nossa escuta sensível, quanto ao que nossa saúde mental está nos dizendo, e se for necessário, admitirmos que precisamos de ajuda, e também de pausas e de descanso.

 

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